ENTREVISTA COM O ESCRITOR ROBERTO CAUSO

O Editor do Portal Cranik "Ademir Pascale"  entrevista o escritor Roberto Causo.
 (27/09/08)

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Roberto Causo - Foto Divulgação

ENTREVISTA:

Ademir Pascale: Primeiramente, agradeço por aceitar a entrevista. Para iniciarmos, gostaria de saber como foi o início de Roberto Causo na literatura.

Roberto Causo: Eu é que agradeço o seu interesse. Depois de um falso começo, quando eu tinha uns 16 anos, peguei firme na escrita meio que por acaso. Saindo do Exército em 1985, eu procurava o que fazer, além de ajudar meu pai no comércio dele em Sumaré, interior do Estado de São Paulo. Acabei integrando um clube de literatura organizado pela biblioteca municipal da cidade, na tentativa de produzir, com ajuda da biblioteca, um fanzine de FC. Uma das primeiras atividades do clube foi uma oficina literária. Eu me sentia embaraçado de participar sem nada para ser avaliado pelo grupo, então acabei escrevendo um conto de FC, que foi muito elogiado pelo coordernador — um jornalista e escritor de Campinas cujo nome não me lembro mais (isso foi em 1985). Mais tarde, meu segundo conto, “A Última Chance” ficou em segundo lugar numa das etapas do Prêmio Fausto Cunha do Clube de Ficção Científica Antares, e isso também me estimulou, me fez acreditar que eu tinha algum potencial. Esse conto seria publicado em 1989 na revista francesa Antarès — Science fiction et fantastique sans frontieres, minha primeira história num veículo profissional. Desde então não deixei de publicar pelo menos um conto por ano, nos mais diversos veículos — jornais literários, revistas masculinas ou de quadrinhos, e até em antologias e revistas de FC propriamente, no Brasil e no exterior. São, no momento, cinqüenta histórias publicadas em dez países. Em 1991, minha noveleta “Patrulha para o Desconhecido” foi uma das três classificadas no Prêmio Jerônimo Monteiro, o primeiro concurso nacional de FC, e isso também foi um incentivo. Meu primeiro livro de contos, A Dança das Sombras, apareceu em Portugal em 1999. Mas foi apenas a partir de 2003, com meu livro Ficção Científica, Fantasia e Horror no Brasil: 1875 a 1950, lançado pela Editora da UFMG, é que passei a ser resenhado na imprensa. Meu último livro é a ficção científica O Par: Uma Novela Amazônica (2008), que venceu o Projeto Nascente 11, um concurso promovido pela Pró-Reitoria de Cultura da USP e pelo Grupo Abril de Comunicações. Saiu pela Associação Editorial Humanitas, da Faculdade de Letras da USP.

Ademir Pascale: Quais são suas principais influências literárias?

Roberto Causo: A paixão da infância e adolescência foi a série pulp alemã Perry Rhodan, criada na Alemanha e que entrou no Brasil em 1975, quando eu tinha 9 anos. Com ela aprendi muito dos diversos subgêneros, temas e enfoques da ficção científica, e alguns truques narrativos que uso até hoje. Foi minha primeira influência, assim como aquele tipo de história de intervenção do estranho no cotidiano, característica da série de TV Além da Imaginação — e, por tabela, dos autores que escreviam para ela, entre eles Ray Bradbury, Richard Mathesou e Charles Beaumont, além do seu criador, Rod Serling. De Perry Rhodan passei para Isaac Asimov, Ray Bradbury e Arthur C. Clarke, mas atualmente acredito que minhas principais influências na FC, na fantasia e no horror são Orson Scott Card, Robin Hobb e Stephen King, além do brasileiro Ivan Carlos Regina e Rubens Teixeira Scavone, um por suas idéias acerca da FC brasileira, o outro pela sua ética de escritor. Tenho emprestado aspectos da ficção de detetive hard-boiled para alguns projetos de dark fantasy, e incluo entre as influências nessa área Raymond Chandler e Robert B. Parker.

Ademir Pascale: Como surgiu a idéia para a criação da sua excelente obra A Corrida do Rinoceronte (Devir, 2005)?

Roberto Causo: Em 1991, um ano de muitas transformações em minha vida, sonhei com um rinoceronte. Um sonho vago, mas que deixou uma impressão muito forte, que eu guardei até uma certa semana de dezembro de 1996, quando estava em férias com a família em Santos, e as idéias começaram a fermentar. No romance, um brasileiro que vai trabalhar em uma pequena cidade do norte da Califórnia vê um rinoceronte caminhando pelas ruas. Esse é o ponto de partida de uma narrativa que inclui reflexões sobre a defesa do meio ambiente e identidade racial, pois esse personagem, Eduardo Câmara, é um mulato que no Brasil passa por branco, mas que naquela região dos Estados Unidos é visto como negro e tem que enfrentar o preconceito, e nisso, rever sua própria identidade. Há ainda um elemento de ficção científica, envolvendo vírus de computadores e imagens digitais. O livro, que foi o meu primeiro romance, despertou boas resenhas.

Ademir Pascale: E o que os leitores encontrarão em A Sombra dos Homens (Devir, 2004)?

Roberto Causo: Um esforço de adaptar e transformar temas e aspectos do folclore brasileiro para um contexto de fantasia heróica. O livro é composto de quatro histórias interligadas, duas delas tendo aparecido anteriormente na revista de RPG Dragão Brasil, de modo a darem à leitura um andamento de romance. A Sombra dos Homens é, eu espero, o primeiro volume de uma série que deverá ter mais três livros. O segundo deverá se chamar “A Sombra da Espada”, com seis histórias, duas delas já prontas. O herói é um índio chamado Tajarê, que se envolve com uma sacerdotisa viking que vem ao Brasil libertar o deus Loki da sua prisão em uma caverna. O livro mistura lendas indígenas com lendas nórdicas, e as novas histórias pretendem emprestar algo das mitologias celta, asteca e maia, e o que mais couber. As amazonas, que na minha interpretação são refugiadas da Atlântida submersa, também comparecem. Essa série tenta aproveitar a tradição de narrativas da Amazônia que integram não apenas a descrição do ambiente e dos povos indígenas, mas que brincam com uma espécie de “pseudo-história” e de uma corrente esotérica brasileira que pressupõe vikings e atlantes chegando aqui antes dos portugueses. São caminhos abertos no passado da literatura especulativa do Brasil por Gastão Cruls, com A Amazônia Misteriosa (1925), e por Jerônymo Monteiro, com A Cidade Perdida (1948). Tajarê é um herói relutante, e além de muita aventura as histórias às vezes trazem um lado mais filosófico. Há também uma “inventividade de linguagem” que tenta traduzir um discurso indígena diferente da língua portuguesa como a gente conhece. O primeiro livro, que tem introdução de Braulio Tavares, chamou a atenção e foi bem resenhado, mas também despertou o descontentamento de quem acredita que fantasia é província exclusivamente européia. Além de mim, Simone Saueressig é uma autora empenhada em mudar essa visão, mas voltada para o campo do infanto-juvenil.

Ademir Pascale: É fato que a literatura fantástica deu um tremendo salto neste dois últimos anos. No seu ponto de vista, quais foram os reais motivos?

Roberto Causo: Boa pergunta. Eu acredito que haja de fato uma nova geração interessada em escrever ficção científica, fantasia e horror, embora muitos sejam apenas pessoas que querem ingressar na literatura e tropeçaram, em suas andanças, com essa abertura de mercado para esses gêneros. Novas editoras estão em atividade — a Devir publicou fantasia primeiro, a Aleph voltou a publicar ficção científica, e a Novo Século tem em André Vianco um best-seller do suspense sobrenatural. Suas narrativas de vampiro encontraram terreno fértil numa geração de fãs dessa área do horror, treinados nas páginas de Anne Rice e de RPGs como Vampiro: A Máscara. O boom do RPG também tem responsabilidade pela difusão da fantasia, alguns anos antes dos fenômenos O Senhor dos Anéis e Harry Potter, no cinema. Esses grandes sucessos de bilheteria fizeram a festa das editoras dos livros em que os filmes foram baseados, respectivamente a Martins Fontes e a Rocco, e abriram as portas para a entrada triunfal, depois de décadas de soluços, da fantasia no Brasil. Editoras médias e grandes sentiram a obrigatoriedade de terem suas próprias séries juvenis de fantasia, e de séries passaram a linhas inteiras como a Rocco Jovens Leitores e a Galera Record. Tanta visibilidade e um novo público interessado em fantasia deve ter convencido pequenas editoras como a Giz Editorial e a Tarja a abrirem suas portas aos autores brasileiros (é mais fácil para as grandes investirem em sucessos internacionais). Orlando Paes Filho provou, como Vianco fizera com suas histórias de vampiro, que um brasileiro pode ter sucesso de vendas com fantasia ou com aventuras medievais. Juntou-se a demanda de novas editoras, com a oferta de novos autores, e a agilidade da Internet e do orkut em informar e coordenar criou uma espécie de distribuição de escritores para as editoras e, agora, para revistas online, resultando num momento como nunca houve na história desses gêneros no Brasil. Até mesmo escritores de sucesso no ambiente da alta literatura, como Nelson de Oliveira, estão se voltando com seriedade para o gênero.

Ademir Pascale: Qual o seu ponto de vista referente ao mercado editorial brasileiro? Existem oportunidades para os jovens escritores que desejam ver suas obras publicadas?

Roberto Causo: Me lembro, envergonhado, de algum momento em fins da década de 1980, em que eu, irado e frustrado, caminhando com os escritores Henrique Flory e Ivan Carlos Regina pelo centro de São Paulo, depois de uma das reuniões do Clube de Leitores de Ficção Científica na Livraria Paisagem, choraminguei: “está todo mundo sendo publicado, menos eu”. O pessoal que está em atividade hoje certamente não tem esse tipo de ansiedade, tamanha é a oferta de espaço para os autores iniciantes. É claro, naquela época eu já imaginava ser um autor publicável, o que podia não ser o caso, daí a minha relativa demora em estrear. O que quero dizer é que o autor iniciante, dotado de um texto publicável, não precisa esperar como eu esperei, e enfrentar essa batalha de conquistar espaços nos mais variados e, às vezes, estranhos veículos. Há editoras tão jovens quanto as carreiras desses novatos, dispostas a abrir espaço — Andross, Devir Livraria, Giz Editorial, Não Editora, Novo Século Editora, Tarja Editorial, Terracota Editora — e publicações na Internet que satisfazem o desejo de ver o seu conto aparecendo num formato profissional, como a IS Magazine, Kaliopes e Terra Incógnita, ou ainda Axxón, uma publicação virtual argentina que tem oferecido espaço aos brasileiros.
Eu apenas sugiro que, diferentemente de como eu agi naquela ocasião, que os novatos não tenham tanta pressa em publicar, e mais em se tornarem publicáveis. É preciso aproveitar o momento não apenas para se lançar como autor, não só para explorar as janelas de mercado, mas para fazer avançar essas literaturas com livros sérios, inovadores e ambiciosos. Se tudo não passar de uma “bolha”, quando ela estourar pelo menos essas contribuições ficarão para o futuro, demonstrando a maturidade ou o potencial da FC, da fantasia e do horror para a literatura brasileira.

Ademir Pascale: Quais dicas você daria para os jovens escritores que desejam ingressar no meio literário?

Roberto Causo: É preciso se enturmar, avaliar o mercado, entender onde e como você pode se integrar a ele. Isso não quer dizer se “vender” ou se “submeter” ao mercado, mas entendê-lo para não perder tempo e para fazer o melhor proveito das oportunidades que aparecerem. E quando digo que é preciso se enturmar, isso vai com um alerta para os excessos da “política literária”, as freqüentes disputas entre um grupo e outro, entre orientações diversas do que é desejável ou não. Também recomendo freqüentar oficinas literárias, estudar técnica narrativa, caracterização de personagens e construção de enredo. Como há muita gente em atividade, o jovem escritor deve se apresentar o mais próximo do pronto que ele puder.

Ademir Pascale: Em quais projetos você trabalha atualmente?

Roberto Causo: Neste exato momento estou terminando uma novela de space opera chamada “Glória Sombria”, para apresentar à Tarja Editorial. Faz parte de uma série iniciada com o conto “Flores Brancas” na revista Portal Solaris, de Nelson de Oliveira. Uma outra história dentro da série, “Descida no Maelström”, deve sair numa antologia que Nelson organizou, Futuro Presente, pela Editora Record. Também trabalho num romance de dark fantasy chamado “O Portal dos Espíritos”, que já passou da metade mas ainda está um pouco longe da conclusão. Organizo para a Devir a antologia “Os Melhores Contos de Ficção Científica Volume 2”. O volume 1 saiu em 2008 e foi um dos produto da Devir que mais chamou a atenção da imprensa mainstream na história da editora. Para a Terracota, devo organizar para o ano que vem a antologia “Contos Imediatos”, também de ficção científica, mas de histórias inéditas. Aguardo para o fim de 2008 o lançamento pela Devir de uma antologia internacional de fantasia também organizada por mim, “Rumo à Fantasia”, com histórias de Orson Scott Card, Ursula K. Le Guin, Bruce Sterling, Ambrose Bierce, Eça de Queiroz, Braulio Tavares, Daniel Fresnot e outros.

Ademir Pascale: Existem novos projetos em pauta?

Roberto Causo: Vários. Romances e novelas em andamento, muitos dentro da série mencionada acima, que eu chamo de “As Lições do Matador”. Também as novas histórias de Tajarê, que exigem muita pesquisa, e um outro romance de dark fantasy chamado “Mistério de Deus”, cujo primeiro rascunho está pronto mas precisa de uma outra demão. Tenho até romances de ficção de detetive iniciados, e não dá para saber quando vou poder sentar para tocá-los.

Ademir Pascale: Onde os leitores poderão saber mais sobre Roberto Causo?

Roberto Causo: Minha página pessoal está em rscauso.tripod.com, e eu compareço semanalmente na coluna que mantenho no Terra Magazine, a revista eletrônica que o jornalista Bob Fernandes criou para o Portal Terra. Nela trato de ficção científica, fantasia e horror na literatura, cinema, televisão e quadrinhos. Em terramagazine.terra.com.br/ultimas/0,,EI6622-SUM,00.html.

Perguntas rápidas:

Um livro: Uma Vez uma Águia, de Anton Myrer
Um(a) autor(a): Orson Scott Card
Um ator ou atriz: Michelle Pfeiffer
Um filme: Blade Runner: O Caçador de Andróides
Um dia especial: 14 de dezembro.
Um desejo: Que o atual momento vivido pela literatura fantástica no Brasil apenas cresça e se multiplique.

Ademir Pascale: Mais uma vez, agradeço por ceder a entrevista. Desejo-lhe muito sucesso em suas empreitadas literárias.

Roberto Causo: Obrigado, Ademir. E eu agradeço muito o seu interesse em me entrevistar.

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O Par - uma novela amazônica - Roberto Causo   

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*Você poderá adicionar essa entrevista em seu site, desde que insira os devidos créditos: Editor e Administrador do http://www.cranik.com : Ademir Pascale - ademir@cranik.com
Entrevistado: Roberto Causo.
E nos informar pelo e-mail: ademir@cranik.com  

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